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O futuro do jornalismo


Por Marília Passos

Fake news, pós-verdade, queda na circulação de jornais impressos. O Jornalismo está em crise? O que esperar do Jornalismo nos próximos anos?

Átomo conversou com Denis Bugierman, colunista do Nexo Jornal, roteirista do Greg News, ex-editor da Superinteressante, e autor do livro “O Fim da Guerra” sobre o presente e o futuro do Jornalismo.


Certezas faltam neste período de instabilidade. “A gente vive um momento de transição em que as novas propostas que entregam valor ainda são pequenas demais, a conta não está fechando com elas, está difícil para elas manterem operação, para elas me entregarem valor suficiente para eu poder ajudar a financiá-las. E o modelo antigo já está quebrado", desabafa o jornalista.

Mas ele também vê iniciativas que podem ser a salvação do Jornalismo, se receberem uma ajuda dos leitores.


“O que eu posso fazer como profissional é tentar fazer um pedacinho desse trabalho. O que eu posso fazer como consumidor de informação é tentar financiar as coisas que eu acredito.”

Confira a entrevista completa!


Para você, qual é o futuro do Jornalismo?

Eu não sei. Não tenho a menor ideia. A gente um momento de incertezas, no momento de maior complexidade da história.


Eu gostaria de conseguir desencanar de me preocupar com isso porque eu acho que saber o futuro do jornalismo não ajuda em nada a fazer meu trabalho de jornalista. E fazer meu trabalho significa fazer as coisas que eu acredito que sejam importantes, para que o jornalismo cumpra sua missão. Se vai ter impacto, se não vai, se o jornalismo vai atrás de mim, se vai todo mundo fazer ou se eu vou ficar lá sozinho, eu não tenho ideia e não eu acho que eu preciso ter.


Mas assim, o que eu quero fazer é ter um olhar legitimamente curioso sobre as coisas, de compreensão. Eu acho que isso está fazendo muito falta na nossa imprensa. Tem pouco gente na nossa sociedade fazendo esse trabalho de olhar o mundo com curiosidade legítima e tentar uma compreensão honesta das coisas. É isso que eu quero fazer porque eu sinto falta desse tipo de coisa. Eu acho que vale para o jornalismo, mas vale para qualquer coisa também.

É muito paralisante a crise que a gente vive. Porque é uma crise sistêmica muito ampla. E às vezes você fica pensando “cara, eu tô aqui ralando e não adianta nada”. Porque, num momento de turbulência sistêmica, o esforço se perde no meio do caos que a gente tá vivendo, né? Eu acho que tem que sair desse modo. No mundo complexo ninguém controla nada. Mas todo mundo tem o poder de influenciar um pouquinho que seja os rumos do mundo, os rumos da nossa civilização, os rumos do jornalismo. Tipo tentar entender o que precisa ser feito, o que me move, o que faz sentido eu fazer.


Por que não conseguimos convencer as pessoas a pagar pelo jornalismo agra? E você acha que vamos conseguir no futuro?

A gente não consegue convencer pelo motivo que a proposta de valor não está fechando. Eu pago uns 20 reais pela Netflix todo mês. Se eu for assinar um jornal vai ser mais caro que isso e, provavelmente, vai entregar menos valor na minha vida que a Netflix entrega. A proposta de valor do jornalismo está quebrada. Em parte porque não tem confiança suficiente nas publicações que existem hoje em dia. Por exemplo, eu assino o Nexo [Jornal], eu pago 12 reais por mês. Eu assinei porque eu quero que exista. Mas o Nexo não supre minhas necessidades de informação. Longe disso. São 30 pessoas. Eles não dão conta de compreender o mundo inteiro. Eles ainda são pequenos demais para substituir aquilo que a Folha fazia por mim anos atrás. E não faz mais.


Então, a gente vive um momento de transição em que as novas propostas que entregam valor ainda são pequenas demais, a conta não está fechando com elas, está difícil para elas manterem operação, para elas me entregarem valor suficiente para eu poder ajudar a financiá-las. E o modelo antigo já está quebrado. Eu já não confio nele. Eu não quero transferir dinheiro da minha conta para a conta da Rede Globo. Eu não quero fazer isso porque eu acho que se eu fizer isso eu dou mais dinheiro para uma organização que eu acho que não ajuda o mundo a melhorar.


Vai ser melhor para o Brasil se a Abril deixar de existir, porque eles atrapalham o Brasil. Eles estão atrapalhando a narrativa, atrapalhando a compreensão das coisas. Mas só eles tem gente suficiente, recurso suficiente, força de trabalho suficiente… Ia ser melhor se eles quebrassem e as pessoas que trabalham lá fossem todas trabalhar em iniciativas independentes que iam se somar e suprir as minha necessidades. Hoje esse modelo não existe.

O que eu posso fazer como profissional é tentar fazer um pedacinho desse trabalho. O que eu posso fazer como consumidor de informação é tentar financiar as coisas que eu acredito. Mesmo que eu dê mais dinheiro para eles do que eles entregam na minha vida. Porque eles ainda não conseguem parar de pé. Mas eu faço isso. Eu escolho algumas organizações que eu quero que exista. Eu quero que Énois, uma escola de Jornalismo independente, exista. Porque eu quero que tenha mais gente, mais lugares na sociedade que sejam capazes de contar histórias com distanciamento. Eu acho que é essa escolha que nós temos que começar a fazer mesmo.


Não comprar um serviço, pagar 260 reais para essa organização mandar 12 publicações, uma mês, ou 365 publicações, uma por dia. É tentar ajudar uma organização porque eu quero que ela exista para eles aprenderem a fazer o trabalho deles cada vez melhor e, quem sabe, daqui alguns anos eles vão suprir essa necessidade que eu tô vendo na sociedade.

É um momento de transição. É tenso. É frustrante. Vai ter coisas que a gente quer exista que vão deixar de existir porque não vai conseguir se viabilizar. Mas é muito interessante também. É o momento de criar coisas novas.


Que coisas novas você vê seguindo esse caminho que você acredita?

Trezentas! Tem muita coisa interessante. O trabalho que A Pública faz é muito interesse. E tem que gente está acordando de manhã e está conectada mais a causa que ao jornalismo. Gente que não é jornalista, mas que todo dia passa pelo Facebook e me supre de conhecimento sobre um universo que eu não tô acompanhando, e não ganha nada para isso. Faz porque acredita na causa.

Se você quer ler coisas bem feitas e profundas, a gente vive num mundo muito melhor que nos anos 1980 e 1990, em que o ecossistema era minúsculo. A gente ficava animadíssimo quando saia uma boa matéria em um jornal. Hoje em dia tem uma quantidade infinita. E, se você souber procurar, tem muito coisa bem feita e honesta e profunda e que te dá insight sobre um universo que você não teria como conhecer de outro jeito. A questão é que essas coisas são uma gota em um oceano de porcaria.


Mas as pessoas sabem procurar?

Elas não sabem. E talvez elas não estejam tão interessados assim porque está todo mundo tão envolvido na tensão desse mundo em colapso que a gente tá mais interessado em conteúdo que nos ajude a destruir nosso inimigo que em conteúdo que nos ajude a entender de maneira honesta o mundo. A gente tá assim. Eu me incluo nessa. As pessoas estão busca de coisas que reforcem suas narrativas mais do que em coisas que aprofundem a compreensão do mundo.

Está difícil. As pessoas estão sem tempo de parar em casa e ler um livro. Mas se você tem tempo, disposição, se você pode parar algumas horas procurando coisa, nunca teve tanta coisa incrível disponível.


Para quem tem disposição

Énois

Agência escola de jornalismo formada por jovens de 16 a 21 de diferentes áreas de conhecimento e da cidade, especialmente da periferia, para pensar e produzir novas pautas, reportagens, formatos e ferramentas para o Jornalismo.


Agência Pública

Agência que aposta em um modelo de jornalismo sem fins lucrativos, produz grandes reportagens pautadas pelo interesse público sob a licença creative commons. Já recebeu o Prêmio Vladmir Herzog na categoria internet e o Prêmio Gabriel García Márquez na categoria Texto, entre outros.


Plataforma para fact-checking (checagem) de discursos de políticos.


Primeiro blog de jornalismo explicativo do Brasil, comandado por Diogo A. Rodriguez.

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