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Tantra não é bem o que você está pensando — e tem tudo a ver com inovação

Professor de yoga, de permacultura e gestor ambiental, conta como o tantra pode te conectar com sua verdadeira natureza

Por Carla Furtado



A natureza sempre guiou a vida de Teo Balieiro. Foi para trabalhar com isso que ele se tornou gestor ambiental e trabalhou com políticas públicas, empreendimentos e paisagismo. E foi pelo mesmo motivo que sentiu necessidade de enveredar por um caminho diferente. “Ao trabalhar com grandes empreendimentos, me vi em muitas situações em que as coisas ‘não eram bem assim’. Eu mediava obras para assegurar que não haveria desmatamento, mas na verdade só ia acontecer uma diminuição, ou o combinado era eliminar o impacto social negativo, mas na hora ainda teria um pouco… Situações de muita truculência e pouca transparência”, conta.


A prática de yoga até lhe dava forças para seguir, mas o que o ajudou a abandonar um estilo de vida que balançava entre o ordinário e o ideal foi o encontro com o tantra yoga, que conheceu através do professor Pedro Franco. “Comecei a praticar yoga por dores nas costas, até que senti muita necessidade de ter uma referência com aprofundamento. Quando conheci o Pedro encontrei o que estava buscando”, relembra. Já a coragem para romper totalmente com o ordinário e se dedicar ao ideal veio quando se conectou com seu mestre espiritual, Sri Prem Baba, encontro que define como “um salto quântico”.

Hoje, além de dar aulas de tantra yoga e de administrar o projeto C-JA — Cultivo do Jardim do Amor (encontros no litoral de São Paulo que unem yoga, meditação, reconexão com a natureza, ecoturismo e desenvolvimentos em grupo), Téo continua dando consultorias paisagísticas e de permacultura, mas dentro de seus moldes: “Hoje eu só trabalho para projetos com uma visão socialmente includente e ambientalmente sustentável. Ajudo empreendimentos a alinharem seus projetos ao uso correto do solo, da floresta, e também a se conectarem com a natureza, porque tudo está ligado. Então se o cara me chamou lá, nós vamos meditar juntos. Se marcamos reunião, vamos meditar primeiro. Se ele quer fazer um mega empreendimento, primeiro vou perguntar como ele cuida do lixo lá na casa dele”, explica.


Na entrevista a seguir, Teo mostra como a reconexão com a nossa natureza pode ser a revolução que precisamos, porque o yoga tântrico é algo tão poderoso e até como o sexo tântrico é uma ferramenta para a quebra de tabus e desconstrução de gênero. Surpreendentemente, esse papo natureba tem tudo a ver com inovação.


Qual a diferença entre o tantra yoga e o yoga tradicional?

Na verdade o hatha yoga também é tantra, porque os asanas [posturas feitas no yoga] vieram do caminho tântrico. No yoga clássico, o de Patanjali, ele apenas cita o asana de sentar com a coluna ereta para meditar. Mas o que difere uma linha de yoga de outra é a filosofia, a visão de mundo. O tantra traz muito a questão da liberdade e da espontaneidade para a desprogramação. Enquanto no yoga clássico existem restrições, deixar de fazer algumas coisas para fazer outras, o tantra propõe que você continue o que está fazendo, mas observando o que está acontecendo para que, a partir dessa sua experiências sem repressão, você possa fazer escolhas mais saudáveis. Além disso, ele tem uma característica inclusiva que permeia diversas linhas. Não existe um tantra fechado, ele está o tempo todo em transformação.


Foi isso que te encantou no tantra?

Sim, eu pratico o yoga tântrico com a abordagem não-dual da Caxemira, região dos Himalaias entre o Paquistão e Índia. De lá vieram as mestras e mestres, afinal o tantra original foi transmitido através das mulheres e tem uma visão matriarcal e de educação religiosa. Gerações da minha família são praticantes do espiritismo kardecista, eu cresci praticando e estudando mediunidade, caridade. E o tantra agrega, tem uma visão de inclusão, me identifiquei muito. Isso me trouxe muitas respostas principalmente através da experiência, das práticas que me trouxeram o despertar da consciência, sentir gratidão pura. É um caminho completo.

O yoga tem ganhado cada vez mais adeptos aqui no Ocidente. Por que voltar a conhecimentos tão antigos é algo inovador?

Acho que com a vida moderna e muito concentrada nas grandes cidades, há o afastamento do ser humano com a natureza, e agora nós temos que usar nossa criatividade para buscar formas de nos reconectarmos com ela como um todo, inclusive com a nossa própria. É possível buscar o que está ao nosso alcance na cidade, como produzir nosso próprio alimento, nem que seja uma hortinha em casa, ou no caso das mulheres, ficarem mais atentas ao ciclo lunar… Acho que esse é um movimento de resgatar a nossa natureza como seres humanos e seres espirituais e esse conhecimento ancestral nos dá bastante suporte. Sempre com essa visão inclusiva, de trazer esses ensinamentos e aplicar ao nosso tempo e nossa própria forma de se relacionar com tudo isso.


O lado mais conhecido do tantra, ao menos no ocidente, é o que aborda o sexo. Afinal, o que é o sexo tântrico?

Toda a sabedoria e práticas que o tantra traz são para expansão da consciência, para você se conhecer e aprender a manipular sua energia vital, inclusive com outra pessoa. E energia vital é sexualidade, é tudo a mesma coisa.


"O tantra tem essa visão de mundo, de estar sempre conectando os opostos: energia feminina e masculina (o que não tem a ver com gênero necessariamente), luz e sombra, positivo e negativo, o espírito e a matéria, etc. E existe muito interesse por isso."


Nos processos do tantra yoga você aprende a elevar essa energia para o coração, através de uma série de técnicas, como de respiração e mantras, que vão criar uma frequência, uma vibração em que você transforma seu estado de espírito, seu corpo e seus sentimentos. Por exemplo, no sexo tântrico o homem faz uma técnica chamada "vajroli", que é inverter o fluxo da ejaculação, ou seja, redirecionar o fluxo da energia para o coração. E às vezes o homem vai ejacular, para então criar o ambiente para sua prática. A grande questão é a não ter a obrigação de ejacular, sabendo que o êxtase será muito maior que de uma ejaculação. Com isso, alinhado com todo o resto, essa experiência orgástica vai para o nível da compaixão, da gratidão, do amor. E se não tiver amor, não é tantra.


Fora as técnicas e o amor envolvido, o que mais faz uma prática sexual ser tântrica?

No tantra, o momento do sexo é ritualizado, existe uma entrega. A pessoa com quem a gente se relaciona, essa alma, é uma manifestação do divino. Chega um momento em que você quebra o paradigma de que o papel do homem é fazer a mulher ter uma série de orgasmos e o da mulher é fazer o homem ejacular. Não estamos querendo chegar a lugar nenhum, mas apenas querendo se amar, explorar, meditar juntos. A partir daí vem um processo de desprogramação para que a gente possa estar mais livre realmente para manifestar algo que é totalmente natural! O princípio tântrico é a espontaneidade, para que você possa se manifestar como é, mas a partir de um estudo de si. Um casal pode escolher fazer esse estudo em conjunto, mas não vai chegar a uma expansão de consciência se cada um não estiver fazendo suas práticas individualmente.

Vivemos numa época de maior liberdade sexual, mas ainda assim existem muitos tabus e condicionamentos. Como o tantra pode ajudar nisso?

O homem e a mulher vêm sofrendo muito com as crenças distorcidas da nossa sociedade, e falando de uma questão de gênero, sinto que o homem está passando por dificuldades para resolver isso. São poucos os canais de compartilhamento para se expressar, para buscar ferramentas que nos levem a ter mais leveza nos relacionamentos e menos cobranças. Muitas vezes o homem tem sua primeira relação sexual com uma prostituta, está numa família que o estimula a ser o pegador que será cada vez mais reconhecido quanto mais mulheres pegar e menos se conectar com essas relações, é ensinado que não pode falhar, que precisa competir, e tudo isso oprime e é causa de vários distúrbios sexuais.


"No processo de se descondicionar, é preciso identificar o padrão, compreender, entrar em paz com aquilo, muitas vezes perdoar, agradecer e aí integrar isso para poder fazer diferente. No tantra, esse é um processo de autoconhecimento e é somente para algumas pessoas que sentem que estão no momento de explorar e se auto-investigar. Muitas vezes as pessoas buscam um receituário, um passo a passo, e não é bem assim, isso envolve uma certa coragem de assumir as rédeas da sua vida, do seu processo, suas escolhas."


Quais as consequências para quem usa tais técnicas sem o devido cuidado?

"Esse conhecimento milenar, que é uma pérola da humanidade, está à disposição para que a gente utilize. Mas isso pode ser usado para o amor ou para a luxúria e muitas das experiências que eu tive nesse caminho de aprendizagem é como a luxúria se apropria de coisas bacanas. Com isso, muitas vezes repetimos padrões do sistema distorcido e patriarcal: dominação, egocentrismo, submissão da mulher e autoritarismo do homem. O que eu venho trazendo é uma visão mais crítica desse caminho, da auto-observação."


Tanto para não reproduzir o modelo machista de dominância quanto para não usar o poder adquirido só para sedução, por exemplo. Porque assim a pessoa está só se complicando, existe uma questão energética que vai acontecendo nas conexões. A energia sexual é muito forte, ela ativa determinados pontos do nosso inconsciente e se não houver suporte e acolhimento, um pouco de amor que seja, a pessoa vai sofrer muito. É preciso estar muito atento ao entrar nesse caminho, porque tudo no tantra é sagrado.

Apesar de ser uma prática que exige muito tempo e dedicação, qualquer pessoa pode experimentar uma massagem tântrica em diversos locais pelo mundo. Qual sua opinião sobre isso?

Acho que as massagens tem a sua finalidade, porque vivemos em uma sociedade muito reprimida sexualmente e as pessoas adquirem muitos traumas e bloqueios energéticos por conta disso. A massagem e uma série de técnicas vão desobstruir esses nós enérgicos para que a energia possa fluir, e funciona muito bem. Em alguns casos é mesmo recomendável, mas não é só isso. Essa é uma parte de um grande processo de liberação para que a gente possa assumir quem somos. Nossa sexualidade, nosso propósito, nossa própria forma de nos expressarmos no mundo.


Qual dica você dá para uma pessoa que pratica o yoga tântrico e quer ter uma experiência sexual tântrica com quem não está nesse caminho?

A grande chave é a pessoa ter a liberdade de ser quem ela é, porque estamos sempre exercendo algum papel, achamos que temos que ser assim e assado. É preciso que você comece a reparar no seu padrão, seja de dominação ou de submissão, porque isso certamente não está na harmonia da natureza. E aí, você pode convidar a outra pessoa a respirar, se acalmar, começar a estimular uma prática sexual mais sutil. É um convite ao aprofundamento do amor, uma quebra de paradigma do jogo de poder e sedução. A questão central é a vontade realmente de se fundir, envolve uma entrega e um abandono do jogo. Mas estar nesse caminho não significa necessariamente que toda vez vai ser assim. Esse despertar de perceber que você não é suas emoções, seus pensamentos, e saber não se identificar com eles, é um treinamento. E a sexualidade é o indicador mais evidente!

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